Notícia retirada na íntegra de: http://www.bbc.com/portuguese/geral-42693483
A expressão "fazer história" parece soar redundante quando se fala de
uma tumba egípcia de 3,5 mil anos atrás. Mas um grupo de pesquisadores
brasileiros está garantindo seu lugar no panteão da ciência nacional
justamente no Egito. O arqueólogo brasileiro José Roberto Pellini,
professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), capitaneia a
primeira missão brasileira que coordena escavações no país.
Sete brasileiros e quatro egípcios trabalham desde 17 de dezembro na
tumba 123/368 da famosa Necrópole Tebana, em Luxor. "Trata-se de um
tumba inédita, que nunca tinha sido aberta, escavada e estudada",
afirmou Pellini à BBC Brasil. "O único registro que havia era de um
expedicionário inglês que esteve aqui no século 19, ficou dois dias e
deixou algumas anotações." Ela fica em uma área conhecida como Sheikh
Abd el-Qurna, um dos setores da necrópole onde estão sepultados os
nobres.
O monumento foi erguido durante o reinado de Tutmés III, o sexto faraó
da 18ª dinastia egípcia, na época conhecida como Império Novo. Não há um
consenso entre estudiosos sobre o período exato do governo de Tutmés
III - alguns acreditam que tenha sido entre 1504 e 1450 a.C.; outros,
entre 1479 e 1425 a.C.
Pellini e sua equipe haviam estado no local para um planejamento do
estudo em março do ano passado. "Já vislumbrávamos muito potencial",
disse. Agora, com a abertura da tumba, a certeza é maior. "Em uma
pequena limpeza já encontramos diversas peças em excelente estado de
conservação. A expectativa é que ela renda muito em termos de
conhecimentos e de objetos nos próximos anos."
Pelo cronograma, os brasileiros concluem esta etapa ainda neste mês de
janeiro. "Até agora nos concentramos em documentar uma série de blocos
de granito, de calcário e de arenito encontrados dentro da tumba. Este
material está sendo fotografado e analisado", explicou o pesquisador. No
início de 2019, eles retornam. E aí sim devem escavar completamente o
local.
A aposta é alta. "Nas intervenções pontuais que a gente fez, a
quantidade de material que saiu é bastante grande. São peças de
sarcófago, pedaços de múmia, pequenas figuras de cerâmica, pedaços de
vasos... Isso só limpando a tumba", disse Pellini. "Com a escavação de
fato, a tendência é que pipoque material importante e, com certeza,
muito bem preservado."
Brasileiros no Egito
Batizada de Bape (sigla em inglês para Programa Arqueológico Brasileiro
no Egito), esta missão é a primeira coordenada e planejada por
brasileiros. Antes, arqueólogos do Brasil já haviam integrado trabalhos
de outras equipes - austríacas, francesas e uma argentina. "Eu mesmo
trabalhei durante oito anos para a missão argentina", relatou Pellini.
O programa Bape foi criado em 2015, com o apoio institucional da
Universidade Federal de Sergipe (UFS) - na época, Pellini lecionava lá.
No ano passado, o professor transferiu-se para a Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG) e o projeto foi encampado pelo Departamento de
Antropologia e Arqueologia da instituição mineira. Atualmente, o
programa está firmando uma parceria também com a Universidade Nacional
de Córdoba, da Argentina.
Todos os custos da missão, por enquanto, estão sendo bancados com
recursos próprios dos pesquisadores. "A UFMG nos dá apoio institucional.
Mas nossa ideia é firmar parcerias que nos patrocinem, inclusive com
órgãos como Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior, vinculada ao Ministério da Educação) e CNPq (Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, do Ministério da Ciência,
Tecnologia e Inovação)", afirmou o professor. "Acredito que na próxima
etapa, em 2019, já teremos algo mais sólido em relação aos
financiamentos."
Para ser viabilizado, o trabalho também foi estruturado a partir de uma
parceria com o governo egípcio - por meio do Centro de Documentação de
Antiguidades, órgão do Serviço de Antiguidades do Egito.
"Nosso projeto é centrado na escavação, na restauração e na conservação
da tumba", explicou o arqueólogo. "Vamos registrar e documentar os
objetos, tentar entender as cenas, as paredes, os hieróglifos, trabalhar
com toda a cultura material que virá da tumba. Por fim, cuidar da
restauração do espaço, que está bem danificado." Na parte antropológica
do projeto, estão previstas conversas com a população local em busca de
respostas interpretativas.
O Egito tem tanta riqueza histórica que, na avaliação de Pellini, "vão
se passar 150 anos e ainda terá muita coisa para ser descoberta por
aqui". "Esta tumba é um exemplo: mesmo na Necrópole Tebana, que já tem
mais de um século de trabalhos arqueológicos, ela nunca foi escavada e
estudada. Então estamos fazendo história aqui", disse.
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